A IMENSA PORTA RANGEU à medida que era
aberta. Com apenas alguns passos, Ele cruzou a oficina vazia e abriu as
venezianas de madeira para que um raio de sol penetrasse na escuridão, pintando
um quadrado de luz do dia no chão empoeirado.
Deu uma olhada na carpintaria.
Permaneceu por um instante no refúgio daquela pequena sala que abrigara tantas
lembranças agradáveis. Pegou o martelo. Passou os dedos pela lâmina afiada da serra. Bateu na madeira já bastante
desgastada do cavalete. Viera para dizer adeus. Chegara o momento de partir. Ouvira
alguma coisa que o fez saber que aquela era a hora. Assim, veio sentir
pela última vez o cheiro de serragem e madeira.
A vida era calma ali. A vida era tão...
Segura. Passara incontáveis horas de alegria
ali. Naquele chão empoeirado Ele brincou e engatinhou enquanto Seu pai trabalhava.
Foi ali que José o ensinou a segurar um martelo. Foi naquela bancada que ele
construiu sua primeira cadeira.
Imagino o que Ele pensou ao dar a
última olhada na sala. Talvez tenha parado por um instante na bancada, olhando
para a pequena sombra projetada pelo cinzel e os cavacos de madeira. Talvez
tenha prestado atenção nas vozes do passado que enchiam o ar. Fico pensando se Ele hesitou. Se seu coração estava
partido. Se segurou algum prego nas mãos, antevendo a dor que sentiria...
A partida deve ter sido difícil. Afinal
de contas, a vida de carpinteiro não era ruim. Não era ruim mesmo. Os negócios
iam bem. O futuro era brilhante, e o trabalho era agradável...
Fico pensando se Ele quis ficar.
“Poderia fazer um bom trabalho aqui em Nazaré. Estabelecer-me nesta cidade. Ter
uma família. Ser um líder da comunidade.” Penso
assim porque sei que ele já havia lido o último capítulo. Ele sabia que os pés
que se afastariam da sombra da carpintaria não descansariam até que fossem
perfurados e pregados numa cruz romana.
Sabe, Ele não precisava partir. Ele
tinha escolha. Poderia ter permanecido. Poderia ter ficado de boca fechada.
Poderia ter ignorado o chamado ou no mínimo deixado para depois. E, se tivesse
optado por ficar, quem saberia? Quem o culparia?
Mas o coração não o deixaria fazer
isso. Se houver alguma hesitação da parte de Sua humanidade, ela foi vencida
pela compaixão de Sua divindade. Sua divindade ouviu as vozes. Sua divindade
ouviu o clamor desesperado do pobre, as acusações amargas do abandonado, o
desespero da incerteza daqueles que tentam salvar a si mesmos. E sua divindade viu os rostos. Alguns franzidos.
Alguns chorosos, Alguns ocultos por trás dos véus. Alguns obscurecidos pelo
medo. Alguns sinceros em sua busca. Alguns pasmos diante do tédio. Do rosto de
Adão à face da criança que nasceu em algum lugar enquanto você lia estas
palavras, Ele viu a todos.
E você pode estar certo de uma coisa.
Dentre as vozes que ecoaram naquela carpintaria em Nazaré, estava a sua voz.
Suas orações silenciosas, feitas num travesseiro manchado de lágrimas, foram
ouvidas antes mesmo de serem feitas. Suas dúvidas mais profundas sobre morte e
eternidade...
Ele partiu por sua casa.
Lucado, Max
Seu Nome é Jesus/ Max Lucado; (traduzido por Emirson Justino)
São Paulo: Mundo Cristão, 2010
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